Especialista afirma que mulheres não têm local de segurança – Ramon Bitencourt/Estadão Conteúdo
O estudo realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, intitulado “Visível e Invisível — A vitimização de Mulheres no Brasil”, indica que, depois dos companheiros, cônjuges ou namorados, são os vizinhos os principais agressores de mulheres no Brasil.
O grupo corresponde a 21,1% dos perfis indicados pelo estudo. Isto quer dizer que uma a cada cinco mulheres ouvidas na pesquisa afirma ter sido agredida por vizinhos. Este número supera, inclusive, o perfil de ex-cônjuges, ex-companheiros ou ex-namorados, com 15,2%.
Conselheira federal da OAB, Alice Bianchini destaca que, nos casos de agressões de vizinhos, as crianças e adolescentes — perfis mais vulneráveis — compõem a maioria das vítimas. “Normalmente, não veem um vizinho como ameaça. É uma situação delicada. Por ser alguém que está perto, há uma confiança”, diz a advogada.
Nós, mulheres, não temos um local de segurança, afirma Soraia Mendes.
Por essa razão, comenta Alice, “é importantíssimo conversar, sempre, para que elas (crianças e adolescente) possam delatar tudo aos pais. Muito provavelmente a família não sabe o que está acontecendo”.
No estudo realizado pelo FBSP, que entrevistou brasileiras de 16 ou mais anos, as mais jovens — entre 16 e 24 anos — foram, de fato, as que apresentaram os maiores índices de vitimização: 42,6% das entrevistadas na faixa etária sofreram algum tipo de violência ou agressão.
Entre as vítimas dos dois perfis predominantes na lista de agressores (companheiros e vizinhos), há pontos em comum: a insegurança na própria casa e a sensação de vulnerabilidade, como aponta Soraia Mendes, professora de criminalidade e advogada especialista em Direitos Humanos. ”A cidade não é segura para a mulher. A casa, também não. Nós, mulheres, não temos um local de segurança”, afirma.
A afirmação da advogada é confirmada pelos números da pesquisa: das agressões relatadas no estudo, 42% ocorreram em casa.
Soraia explica que os perfis das vítimas de violência doméstica, em geral, estão ligados à vulnerabilidade. “Há picos [de casos de agressão] em relação a meninas e jovens. O número se estabiliza na idade adulta e volta a crescer em idades mais avançadas. A questão da vulnerabilidade é fundamental”, afirma.
Gráfico dos perfis de agressores de acordo com o estudo do FBSP – Reprodução
O que pode ser feito para enfrentar o problema.
Soraia afirma que as soluções para o problema da violência contra a mulher — seja por vizinhos, cônjuges ou ex-companheiros — são, principalmente, a longo prazo.
“[A solução] é o investimento em educação e discussões de gênero, discussões de igualdade entre homens e mulheres”, afirma a especialista em Direitos Humanos.
Há, também, segundo a advogada, a necessidade de ações mais urgentes. “Nesse momento de caos, com uma mulher assassinada a cada duas horas, com 107 feminicídios nos primeiros [20] dias de 2019, são necessárias políticas públicas por parte do Estado”, diz Soraia.
Entre possíveis soluções mais ‘rápidas’, ela destaca a necessidade de “criação de espaços de acolhimento às mulheres e uma mudança de cultura jurídica e no sistema de justiça criminal”. “Da forma que está”, comenta, “fica aberta a possibilidade de que as mulheres vivam com a sensação de impunidade”.
Para denunciar um caso de agressão contra uma mulher, em qualquer lugar do Brasil, o número a ser discado é o 180, da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência. O serviço é gratuito e confidencial.